Introdução
Se já é difícil ter ciência das
estrepolias que os donos do poder fazem em pé ou sentados, imaginem
saber o que eles fazem deitados, debaixo dos lençóis (aqui),
usando (indevidamente, claro) o dinheiro público (a soma de todos esses
desvios cleptocratas, seguramente, gera danos sociais incomensuráveis).
Quando
o gozo é deles (dos donos do poder) e a conta (sobretudo das pensões
nebulosas) vai para nossos bolsos (de forma direta ou indireta), o
assunto privado passa a ser de interesse público. Desnuda-se o manto da
privacidade. Daí a série de artigos que segue (envolvendo FHC, Renan,
Lula, Collor etc.).
FHC, depois das confissões de sua ex-amante Mirian Dutra(aqui) (nos anos 80/90), perguntou: “Por que discutir como se fosse pública uma questão privada”?
A
questão deixa de ser privada quando há provas ou fundadas suspeitas de
envolvimento do dinheiro público (no seu caso, uma concessionária das
lojas duty freee dos aeroportos brasileiros, que fez um contrato
fictício de emprego com a ex-amante de FHC, para complementar seus
rendimentos).
Todo gozo alheio (gozo dos donos do poder) que
tangencia os bolsos dos contribuintes passa a ser um gozo nacional,
submetido à necessária transparência que a vida republicana exige (pouco
importando o partido ou a ideologia do dono do poder – o povo tem
direito de saber tudo sobre corrupção, independentemente da coloração
partidária ou ideológica do corrupto).
Capítulo I – Renan Calheiros e Mendes Júnior
Renan
Calheiros é um emblemático político do jeito antigo que deveria ser
abolido do Brasil, que se tornou o paraíso da cleptocracia não por
acaso: aqui o Estado é dominado e governado por agentes públicos e
privados que fazem da corrupção endêmica e das pilhagens sistêmicas uma
das fontes de acumulação indevida e impune de riqueza.
O medonho
escândalo de 2007 do senador com a Mendes Júnior – que o levou a
renunciar à presidência do Senado para salvar seu mandato – não teve
resposta judicial até hoje. Seu processo foi tirado da pauta do STF (em
fev/16). A presunção de impunidade dos barões ladrões, no seu caso,
continua com todo vigor.
“Nas favelas, no senado
Sujeira pra todo lado.
Ninguém respeita a constituição.
Mas todos acreditam no futuro da nação.
Que país é esse?” (Legião Urbana, composição de Renato Russo, 1987).
O
senador Renan teve uma filha extraconjugal com a jornalista Mônica
Veloso. Até aqui, o lado privado da questão. A empreiteira Mendes
Júnior, por interpostas pessoas, pagava à jornalista, em dinheiro
corrente, o valor de uma pensão mensal da filha. Isso era feito em
virtude das emendas que o senador fazia aprovar em benefício da
empreiteira. O gozo do senador virou assunto público.
Em um país
que é o paraíso da cleptocracia a regra é clara: faça filhos e mande a
conta para todos. Tudo se tolera, até mesmo o pagamento de pensão de
filho alheio com o dinheiro público. Mas isso não constitui motivo
suficiente para sensibilizar o STF, a ponto de receber a denúncia contra
o senador, excluindo-o da vida pública.
O ex-Procurador-Geral da
República (Roberto Gurgel) só ofereceu denúncia contra Renan em 2013
(seis anos depois dos fatos), precisamente quando o senador foi reeleito
para a presidência do Senado (como se ficha limpa fosse). Que país é
esse?
A denúncia está no STF há mais de 1.100 dias. Imputam-se os
crimes de peculato, falsidade ideológica e uso de documentos falsos.
Mais do que corrupção endêmica (pública e notória), um país somente se
transforma em paraíso da cleptocracia quando todas as instituições
(políticas, econômicas, jurídicas e sociais) fracassam em suas funções
(destacando-se aí as instituições jurídicas assim parte da sociedade
civil, tolerante com a desfaçatez dos agentes públicos).
Sexo, poder e dinheiro
Sexo, poder e dinheiro, como objetos (inconscientes ou conscientes) do desejo, marcam o affaire
Renan Calheiros-Mônica Veloso. O objeto do desejo, psicanaliticamente, é
revelado pelo exibicionismo ou pelo voyeurismo. O par complementar do
exibicionismo é o voyeurismo. Mônica pousou nua. Com ou sem publicidade,
o nu gera enorme excitação.
O psicanalista Renato Mezan, na
época dos fatos, explicou: “ao nos entregarmos ao deleite de a olhar,
colocamo-nos na mesma posição daqueles com quem ela teve relações. Ora,
Mônica Veloso certamente teve outros namorados, mas é com o senador
Calheiros que se identifica quem compra a “Playboy” ou acessa o site da
revista” (Folha de S. Paulo de 14.10.07, Mais, p. 4).
Todos
gostaríamos, diz o psicanalista, “de poder exibir impunemente aquela
postura arrogante do senador alagoano, de poder pisotear impunemente as
regras do convívio civilizado e de impor nossa vontade aos outros com
truculência. Ao comer com os olhos a mulher que foi dele, usufruímos por
um instante dos prazeres que ele desfrutou” (Renato Mezan). O
articulista conclui: “no nosso inconsciente não nos basta ser amigos do
rei: somos o próprio rei, o herói, o caubói”. Muitas vezes, o herói sem
caráter macunaímico.
Mas o brasileiro concorda que alguém eleito
para cargo público possa usá-lo como se fosse propriedade particular, em
benefício próprio [inclusive da própria libido]? 10% estão de acordo
com isso (Alberto Carlos Almeida, A cabeça do brasileiro, São
Paulo: Record, 2007, p. 20 e 30). Outro enorme percentual tolera isso
(do contrário o senador não teria ficado impune até hoje).
Por
meio da corrupção, é frequente a trilogia sexo, poder e dinheiro
protagonizar engendrados triângulos amorosos: o dono do poder (no caso,
um senador) satisfez seu objeto do desejo (sexo), a empreiteira Mendes
Júnior também alcançou o seu (dinheiro conquistado por emendas
parlamentares) e a jornalista queria um espaço no mundo das
celebridades, como escreveu Eliane Robert Morais, na Folha de S. Paulo
de 14.10.07, Mais, p. 5).
Os que podem (os donos do poder)
conquistam seus objetos de desejo fraudulentamente (corrupção, fraude
em licitações, superfaturamentos, dinheiro em paraísos fiscais, lavagem
de dinheiro etc.). Os que não podem (os que não são os donos do poder), o
fazem violentamente. Os consumidores platônicos, sem meios para
consumir licitamente, se obrigam a algum tipo de ilegalidade (quando
querem se apoderar de algum objeto de desejo).
Os que podem e
mandam (os donos do poder) contam com a prerrogativa de abusar e
transgredir (impunemente) as regras da civilização e da moralidade. As
contas dos seus objetos de desejo, muitas vezes, são pagas pela
população. A ilegalidade dos donos do poder (Foucault) acontece
normalmente por meio da fraude. Os despossuídos, que são os chamados
“sujeitos monetários sem dinheiro” (sujeitos que vivem sem salário,
emprego etc., consoante Roberto Schwarz), alcançam a mesma ilegalidade
mais comumente por outro caminho: pela violência.
Cada um usa a
linguagem, os recursos e meios que conhece. A isso Roberto Schwartz deu o
nome de “desigualdade social degradada”: os donos do poder cleptocratas
assim como seus súditos criminosos se merecem mutuamente; nem existe a
pureza popular, nem a elite nunca abandonou suas roubalheiras, que
constituem uma das formas de se menosprezar os miseráveis. Não existe,
portanto, nem a decantada pureza proletária nem tampouco a benevolência
inculpável na opulência.
De um lado, “trabalhadores
desmoralizados pelo desemprego e rendidos ao imaginário burguês; de
outro, uma burguesia ressentida e lamentável, invejosa de suas
congêneres do Primeiro Mundo e queixosa de não morar lá, além de
amargurada com a insegurança local, que azedou os seus privilégios”
(Roberto Schwarz, Folha de S. Paulo de 11.08.07, p. E9). Aliás, também a
operação Lava Jato está amargurando os barões ladrões ressentidos.
A
que conclusão se chega? A luta de classes no Brasil foi substituída
pela “desigualdade social degradada”. Ninguém mais está satisfeito. E o
pior: não há “nenhuma perspectiva de progresso, que torne o país
decente”, sem corrupção, delinquência econômica e violência.
A
presunção de im (p) unidade penal está previamente garantida aos que
podem (veja o triângulo amoroso formado pelo senador, pela jornalista e
pela empreiteira, até hoje sem nenhuma resposta do Judiciário). Para os
destituídos de poder a presunção é outra: de culpabilidade.
O
Brasil é um país hierarquizado (DaMatta). Com isso, a posição e a origem
social são fundamentais para se definir o que se pode e o que não se
pode fazer; para saber se a pessoa está acima da lei ou se teria que
cumpri-la (Alberto Carlos Almeida, A cabeça do brasileiro, São
Paulo: Record, 2007, p. 16). Quem institui a ordem social, institui
também a ordem jurídica e os castigos. Quem tem o poder de castigar tem
também o poder de não castigar.
Como se vê, levando-se em conta a
trilogia sexo, poder e dinheiro, dentro dos dois Brasis estão
distribuídos dois tipos distintos de cidadãos: os que p (h) odem tudo
impunemente e os que não p (h) odem impunemente.
CAROS
internautas: sou do Movimento Contra a Corrupção Eleitoral (MCCE) e
recrimino todos os políticos comprovadamente desonestos assim como sou
radicalmente contra a corrupção cleptocrata de todos os agentes públicos
(mancomunados com agentes privados) que já governaram ou que governam o
País, roubando o dinheiro público. Todos os partidos e agentes
inequivocamente envolvidos com a corrupção (PT, PMDB, PSDB, PP, PTB, DEM, Solidariedade, PSB etc.), além de ladrões, foram ou são fisiológicos (toma lá dá ca) e ultraconservadores não do bem da nação, sim, dos interesses das oligarquias bem posicionadas dentro da sociedade e do Estado. Mais: fraudam a confiança dos tolos que cegamente confiam em corruptos e ainda imoralmente os defende.
Professor
Jurista e professor. Fundador da Rede de Ensino LFG. Diretor-presidente do Instituto Avante Brasil. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001). [ assessoria de comunicação e imprensa +55 11 991697674 [agenda de palestras e entrevistas] ]