domingo, 30 de junho de 2019

COMO ESCREVER UMA BOA PETIÇÃO INICIAL?


Petições iniciais devem ser simples, objetivas e, dentro do possível, curtas para que o juiz não perca a atenção durante a leitura. As iniciais também devem apresentar um pedido claro e direto, sem tentar induzir o magistrado a realizar uma decisão. Segundo seis juízes de diferentes áreas do Direito entrevistados pelo JOTA, essas são as principais dicas para se escrever uma boa petição.
Para Andréa Pacha, juíza da 4ª Vara de Órfãos e Sucessões do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ) e escritora, uma petição é uma “história bem contada com um pedido no final”.
Segundo ela, quanto mais objetiva e reduzida for a petição, maiores chances da apreciação do juiz ser feita com mais cuidado. Peças com frases fora da ordem direta e com textos desnecessários dificultam a leitura e o entendimento.
“Temos um volume imenso de trabalho. Se a petição se tornar uma tese, perdemos a atenção. Tem de haver a clareza do que está se pedindo, colocando somente o conteúdo necessário”, afirma Andréa.
Para a magistrada, petições muito longas, sobretudo em processos simples, também podem mascarar o conhecido processo de copiar e colar – também conhecido como “Ctrl+C, Ctrl+V” – conteúdo.
Andréa, que já atuou em varas de família, explica que os pedidos nesta área do Direito costumam ser mais simples, e não há necessidade de petições longas. Mesmo assim, ela afirma receber documentos prolixos e com adjetivações.
“Muitos adjetivos podem comprometer a compreensão. As pessoas envolvidas em um processo familiar normalmente estão vivendo uma situação complicada e estressante em suas vidas. Um único adjetivo mal colocado no texto pode gerar um novo conflito”, disse.

Para Alfredo Attié, desembargador da 26ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) e presidente da Academia Paulista de Direito, uma boa petição deve ser breve, com cinco a 15 páginas. Caso o assunto seja mais complexo, o magistrado recomendou que as iniciais tenham até 20 páginas.  “Nenhum juiz tem tempo para ler acima disso para entender uma causa”, avalia.

De acordo com o magistrado, citações de legislação, jurisprudência e artigos não devem ser feitos no corpo da petição, mas nas notas de rodapé. “Na petição, é importante haver somente o texto do advogado para a leitura fluir com facilidade”.

O magistrado também recomendou que os advogados evitem repetições de argumentos e jurisprudências. “Quanto mais se repete, maior será a perda de interesse na leitura”, afirma o juiz.

Outra recomendação feita por Attié é colocar no início da petição um resumo e a ordem dos argumentos, além deixar claro o que o advogado defenderá na petição. “Isso deve ser feito apenas sugerindo seus argumentos, não induzindo o juiz em sua decisão”, diz.

Para ele, é importante que documentos anexos sejam numerados e que os advogados evitem documentos “inúteis”.

“Linguagem, e não design gráfico”

Para Marcelo Sacramone, juiz da 2ª Vara de Falências do TJSP, os defensores devem evitar períodos longos e “frases intermináveis”. Ele recomenda que as frases tenham, no máximo, duas linhas. O ideal é que cada parágrafo tenha duas ou três frases.

Segundo Sacramone, a descrição dos fatos é a parte mais importante da peça e a que mais tem sido negligenciada pelos defensores. “Os advogados precisam ter uma noção clara do que aconteceu, os motivos que levaram seus clientes a realizar o pedido. Tudo isso deve ser colocado de forma clara e que faça sentido”, diz.

Para ele, a primeira tarefa da petição é esclarecer os fatos e acontecimentos do processo. Depois, o advogado pode iniciar o processo de convencimento do magistrado. “O juiz precisa saber exatamente o que é que está sendo pedido, e o advogado deve se colocar no papel do leitor para escrever uma petição clara e concisa”, declarou.

De acordo com Guilherme Feliciano, juiz da 1ª Vara do Trabalho de Taubaté do TRT-15 e presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (ANAMATRA), os advogados devem evitar repetições de jurisprudências.

“Não faz sentido trazer uma jusrisprudência de tribunal regional, sendo que já foi colocado na mesma petição uma jusrisprudência do STF. Assim, a primeira perde a relevância”, afirmou.

Outra dica do juiz é evitar o uso de palavras  grifadas ou deixar frases com cores diferentes. Segundo ele, isso ajuda a deixar o documento com um visual limpo. “A ferramenta do advogado é a linguagem, e não o design gráfico”, disse.

Dicas para estudantes
Para o juiz e professor do curso Damásio Educacional, Guilherme Madeira, a principal dica para estudantes de Direito é a leitura de obras da literatura clássica e moderna, e não somente de livros jurídicos. “Só escreve bem quem for um bom leitor. Esse hábito ajudará que os estudantes escrevam, futuramente, petições de agradável leitura”, afirmou.

Segundo o diretor da Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 2ª Região (AMATRA-2) e juiz do trabalho, André Dorster, o estudante deve começar a prática de redigir petições ainda durante o estágio profissional.
“Também recomendo auxiliar os advogados do escritório na produção de peças e acompanhar audiências para entender melhor o funcionamento da Justiça, principalmente a trabalhista, que possui diferenciações’, afirmou.

De acordo com Feliciano, presidente da ANAMATRA e professor de Direito da USP, muitos estudantes só aprendem o processo e a linguagem de uma boa petição após entrar no mercado de trabalho. Para ele, matérias optativas para aplicações forenses podem auxiliar estudantes a aprimorar o texto em petições.

quarta-feira, 3 de abril de 2019

STJ - Ilegalidade da Taxa de Conveniência cobrada por site






Terceira Turma considera ilegal cobrança de taxa de conveniência na venda de ingressos on-line

 A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) restabeleceu sentença que reconheceu a ilegalidade da taxa de conveniência cobrada pelo site Ingresso Rápido na venda on-line de ingressos para shows e outros eventos.

O colegiado considerou que a taxa não poderia ser cobrada dos consumidores pela mera disponibilização de ingressos em meio virtual, constatando que a prática configura venda casada e transferência indevida do risco da atividade comercial do fornecedor ao consumidor, pois o custo operacional da venda pela internet é ônus do fornecedor. A ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso julgado, explicou que a sentença restabelecida foi proferida no âmbito de uma ação coletiva de consumo, e por isso tem validade em todo o território nacional.

Na origem do caso julgado pela Terceira Turma, a Associação de Defesa dos Consumidores do Rio Grande do Sul (Adeconrs) moveu a ação coletiva em 2013 contra a Ingresso Rápido e obteve sentença favorável na 16ª Vara Cível de Porto Alegre.

Venda casada

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) reformou a sentença por entender que a aquisição dos ingressos on-line é uma opção ao consumidor, haja vista se tratar de alternativa à compra presencial, que também é oferecida pela Ingresso Rápido, não sendo sua utilização obrigatória. Para o TJRS, o oferecimento dos ingressos na internet é uma comodidade adicional que gera custos que justificariam a cobrança da taxa, sob pena de enriquecimento ilícito do consumidor.

Segundo Nancy Andrighi, uma das formas de violação da boa-fé objetiva é a venda casada, a imposição de uma contratação indesejada de um intermediário escolhido pelo fornecedor, limitando a liberdade de escolha do consumidor.

 A relatora citou julgado repetitivo da Segunda Seção que adotou o entendimento de que, nos casos de intermediação por meio de corretagem, como não há relação contratual direta entre o corretor e o terceiro (consumidor), quem deve arcar, em regra, com a remuneração do corretor é a pessoa com quem ele se vinculou, ou seja, o fornecedor.

Transferência indevida do risco

De acordo com a relatora, “a venda do ingresso para um determinado espetáculo cultural é parte típica e essencial do negócio, risco da própria atividade empresarial que visa o lucro e integrante do investimento do fornecedor, compondo, portanto, o custo embutido no preço”.

Ela acrescentou que a venda dos ingressos pela internet alcança interessados em número infinitamente superior ao da venda por meio presencial, privilegiando os interesses dos promotores do evento.

Nancy Andrighi destacou que a cobrança da taxa de conveniência pela mera disponibilização dos ingressos na internet transfere aos consumidores parcela considerável do risco do empreendimento, pois os serviços a ela relacionados, remunerados pela taxa de conveniência, deixam de ser suportados pelos próprios fornecedores. Para a ministra, o benefício fica somente para o fornecedor.

A vantagem que o consumidor teria ao poder comprar o ingresso sem precisar sair de casa, segundo a
ministra, acaba sendo “totalmente aplacada” quando ele se vê obrigado a se submeter, “sem liberdade”, às condições impostas pelo site de venda de ingressos e pelos promotores do evento, o que evidencia que a disponibilização de ingressos via internet foi instituída exclusivamente em favor dos fornecedores.

A ministra lembrou que no, caso analisado, não há declaração clara e destacada de que o consumidor está assumindo um débito que é de responsabilidade do incumbente – o promotor ou produtor do espetáculo cultural – “não se podendo, nesses termos, reconhecer a validade da transferência do encargo”.

Dano moral coletivo

Nancy Andrighi afirmou que o dano moral coletivo pedido na ação não ficou caracterizado, já que a ilegalidade verificada não atinge valores essenciais da sociedade, configurando mera infringência à lei ou ao contrato em razão da transferência indevida de um encargo do fornecedor ao consumidor.

REsp 1737428